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TRABALHO A DISTÂNCIA SUBORDINAÇÃO POR MEIOS TELEMÁTICOS E INFORMATIZADOS

A nova Lei Trabalhista de nº 12.551/2011, que equipara os efeitos jurídicos da subordinação exercida por meios telemáticos e informatizados à exercida por meios pessoais e diretos, desde a sua publicação, em 16/12/2011, tem gerado inúmeras polêmicas principalmente no que se refere à jornada de trabalho e caracterização de horas extras a favor dos empregados.

Ressalvando o respeito que merecem as opiniões divergentes, ao meu ver, essa polêmica é despropositada, já que a nova lei em discussão tem por objeto reconhecer a equivalência entre o trabalho realizado dentro e fora do estabelecimento do empregador, equiparando a subordinação direta àquela exercida por meios telemáticos e informatizados, nada dispondo sobre a duração da jornada de trabalho, que tem um capítulo próprio na CLT para discipliná-la.

O caput do artigo 6º da CLT ficou com a seguinte redação:
“Art. 6o Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.”

Redação anterior:
“Art. 6o Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e o executado no domicílio do empregado, desde que esteja caracterizada a relação de emprego.”

A mudança substancial no referido caput do artigo, foi agregar o “trabalho realizado a distância”, cujo único efeito é o de ampliar a abrangência de incidência do dispositivo legal, no que se refere ao trabalho realizado fora do estabelecimento, para além do domicílio do empregado, hipótese, por exemplo, de trabalho em outro Município, outro Estado, diverso do local do domicílio do empregado. Aliás, com a inserção do termo “realizado à distância”, desnecessário seria manter o termo “executado no domicílio do empregado”, já que aquele abrange esse.

A própria lei e jurisprudência trabalhista já aceitavam a equivalência entre o trabalho dentro e fora da empresa. A propósito, o julgado abaixo para melhor ilustrar:

EMENTA: COSTUREIRA. TRABALHO EM DOMICÍLIO. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. Não existe incompatibilidade legal ou lógica entre contrato de emprego e a atividade de costureira em domicílio, notadamente quando a apropriação da força de trabalho é feita por empresa voltada para o ramo de confecções, que toma os serviços pessoais da trabalhadora, engaja-a na atividade-fim, submete-a ao seu poder diretivo, fixa o valor a ser pago, fornecendo matéria prima, definindo os padrões de produção e fiscalizando o desempenho do trabalho. Recurso da autora a que se dá provimento para reconhecer o vínculo empregatício havido entre as partes. Processo: RO: 01234200402302009. Data de Julgamento: 21/02/2006, Relator Juiz: RICARDO ARTUR COSTA E TRIGUEIROS, 4ª Turma, Data de Publicação: DOE 10/03/2006.

De qualquer forma, até aqui, a norma trata apenas e tão somente da equivalência entre o trabalho realizado dentro e fora do estabelecimento do empregador.

A nova lei inseriu ainda o parágrafo único no artigo 6º da CLT, que assim estabelece:

“Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.”

A inserção normativa supra mencionada nada mais fez do que equiparar a subordinação que é aquela exercida por meios pessoais e diretos pelo empregador ou seus prepostos com a exercida por meios telemáticos e informatizados, nada tratando também sobre a jornada de trabalho.

O parágrafo único do artigo 6º da CLT reconheceu os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão, como suficientes para comprovar a subordinação, a medida em que os equipara aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.

Respeitando os defensores dessa lei sob o argumento de que vem se adequar a modernidade, particularmente discordo, por entender desnecessária essa inserção do parágrafo único sob comento. Isso porque, uma vez que o artigo 3º da CLT estabelece os requisitos do vínculo de emprego, quais sejam: habitualidade, onerosidade, pessoalidade e subordinação, por óbvio que, se comprovada a presença desses requisitos, inclusive a subordinação (o que já podia ser feito por todos os meios lícitos de prova, como os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão), a legislação existente antes da nova lei aqui analisada, já impunha o reconhecimento do vínculo de emprego.

De qualquer forma, o que pode-se dizer desse novo texto legal é que reconhece como prova lícita da subordinação os meios telemáticos e informatizados de comando controle e supervisão do trabalho alheio, o que, ao meu ver, já era mesmo lícito, independentemente da mudança legislativa em questão.

Independentemente dessa nova lei, é claro que competirá ao juiz do trabalho, diante de um caso concreto emitir um juízo de valor sobre a prova da subordinação por meios telemáticos ou informatizados, que vier a ser produzida pelo interessado, e, a partir dessa avaliação formar sua convicção quanto a efetiva comprovação da subordinação.

A subordinação, como requisito essencial e primaz da relação de emprego, já que os outros requisitos (habitualidade, onerosidade e pessoalidade), estão também presentes noutras modalidades contratuais de trabalho, como o trabalho autônomo, por exemplo, é tratada com destaque, já que é fator determinante no reconhecimento do vínculo empregatício.

Portanto, fica evidente que o artigo 6º e seu parágrafo único, com a nova redação que lhe foi atribuída pela Lei nº 12.551/2011, tem por finalidade principal o reconhecimento da relação de emprego, nada dispondo sobre a jornada de trabalho.

Porque então a polêmica sobre a jornada de trabalho, a partir da publicação dessa lei?

Parece-me que a polêmica se instalou nas discussões mais recentes sobre o tema, principalmente em razão de algumas empresas adotarem a prática de dar continuidade ao trabalho de seus empregados após o expediente normal, e o horário desse trabalho ficar registrado em correspondências eletrônicas (e-mail), transmitidos fora da jornada normal de trabalho, seja no próprio ambiente de trabalho ou fora dele. Noutros casos, empregados que ficam de posse de celular ou rádio da empresa, mesmo após a jornada normal de trabalho.

Respondo essa questão com outra pergunta e a respondo: diante desse quadro, o que muda a nova lei? Nada.

Mesmo sem a nova lei, se comprovado que o empregado se ativou fora do horário normal de trabalho, já teria direito de receber pelo trabalho suplementar. Os e-mail corporativos, os efetivos atendimentos via rádio ou celular, já poderiam fazer essa prova, é claro, a ser avaliada pelo critério da livre convicção do juiz, o que não mudou.

A discussão que se acirrou é com relação a outra questão correlata, o tempo a disposição do empregador, ao qual faz alusão o artigo 4º da CLT, ou seja: “considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada”

O Tribunal Superior do Trabalho, regulamente essa questão do sobreaviso, com o uso de aparelho de intercomunicação, através da Súmula 428, abaixo transcrita para melhor ilustrar:

Súmula Nº 428 do TST SOBREAVISO (conversão da Orientação Jurisprudencial n.º 49 da SBDI-1) – Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011 O uso de aparelho de intercomunicação, a exemplo de BIP, “pager” ou aparelho celular, pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço.

Li notícia publicada no Jornal Valor Econômico em 11/01/2012, de que o Tribunal Superior do Trabalho pretende alterar a Súmula 428 TST, em razão dessa nova lei.

Não me parece haver essa necessidade, pois, repito, a nova lei não trata da duração da jornada de trabalho. Mesmo se partirmos da idéia de que somente com essa nova lei é que passou a ser reconhecido o trabalho por meio telemático ou informatizado, ainda assim, para que o empregado tenha direito a horas extras, à evidência, deve comprovar que o trabalho foi realizado fora da sua jornada normal (exatamente como já acontece hoje e está bem regulamentado pela Súmula 428 do TST).

Observe-se o julgado abaixo, muito antes dessa nova lei:

“TRABALHO EXTERNO. CONTROLE MEDIANTE APARELHO DE COMUNICAÇÃO. DIREITO A HORAS EXTRAS. O controle da jornada de trabalho externo, mediante aparelho de comunicação utilizável como telefone celular, rádio ou Pager, é constitutivo do direito ao recebimento de horas extras, quando caracterizada a extrapolação do limite legal de duração do trabalho.” (Recurso Ordinário nº 19990582346 – Acórdão nº 20010111667 – São Paulo – Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região – Oitava Turma – Juíza Relatora Vilma Nogueira de Araújo Vaz da Silva – julgado em 19.03.2001 – DJ in 10/4/2001)

Por esse prisma, não só em função dessa nova lei, mas independentemente dela, as empresas devem pagar as horas extras apuradas por todo o trabalho extraordinário realizado pelos seus empregados. Para não se sujeitarem a
situações onde sejam produzidas provas dissonantes dos fatos verdadeiros para utilização futura em demandas trabalhistas infundadas, o recomendável é que determinem a utilização, por seus empregados, apenas e tão somente de e-mail corporativos, através de gerenciador de e-mails (de maneira que o empregado somente possa acessar os e-mails dentro do estabelecimento do empregador), que mantenham software que impeça a programação de horários para remessa de e-mail e que exerçam um rígido controle sobre esse material de trabalho. Recomenda-se que evitem a utilização de notebooks pelos seus empregados e que proíbam o uso de e-mails pessoais para o trabalho.
Recomenda-se ainda que os rádios e celulares necessários para o trabalho diário, sejam sempre devolvidos ao final do expediente.

Essas recomendações não se aplicam àqueles que exercem cargos de confiança e trabalhadores externos que exercem atividade incompatível com o controle de horário (artigo 62 da CLT), já que não estão sujeitos às limitações de jornada definidas no Capítulo II da CLT.

A matéria é ainda muito recente e as discussões e divergências estão se ampliando cada vez mais, por isso, a expectativa é que surja em breve alguma regulamentação por parte do próprio Poder Público que possa conferir uma uniformização de entendimento sobre o tema.

Rodolfo André Molon
Molon e Batista – Serviços de Advocacia